quarta-feira, 25 de setembro de 2024

Reza a lenda que um dia uma linda Sereia,
Ansiando nova aventura, saiu do mar.
Yemanjá assistia encantada quando lá na areia
A Sereia batendo palmas começou a sambar.

Nas pontas dos novos pés, o pulmão cheio de ar,
Na sua nova vida terrena, que o Sol incandeia,
A Sereia dançante andava pela praia, ainda alheia,
Molhando o corpo bronzeado para a pele salgar.

O que ela não sabia é que além do horizonte
Rimava um Poeta, uma ode a Sereia estonteante.
Essa que ele nem sonhava que um dia conheceria.

Inexplicavelmente quiseram as teias do destino
Revelar ao Poeta os caminhos de um amor tão divino:
Amor de Sereia, de samba, de mar e de Poesia.

V.

domingo, 22 de setembro de 2024

Às vezes não parece, mas sei falar de amor.
Já escrevi lindos sonetos românticos,
As poucas que receberam tais cânticos
Com certeza nunca esquecerão do autor.

Quem já recebeu um poema doce como alfajor
Não se contentará com versos patéticos.
Azar de quem não tiver dons poéticos,
Esses, que comprem chocolates ou flor.

Piadas à parte (na verdade, arrogância),
Não tenho toda essa rutilância,
Sou um monstro feito de pura escuridão.

Se meu papel às vezes brilha,
Se eu escrevo sobre alguma maravilha,
É apenas por causa da Musa da minha canção.

V.

sábado, 21 de setembro de 2024

Não mereço nenhuma das paixões que despertei.
Tampouco os amigos que fiz.
Meu valor está no fundo das garrafas que sequei,
No meu charme e nos meus ardis.

Não caia na teia da minha rima infeliz,
No conto do meu eu-lírico que eu mesmo defenestrei,
E cujos delirantes versos febris
Descaradamente usurpei.

Não se iluda com o meu ritmo,
Com a métrica do meu verso íntimo,
E nem com meus textos autodepreciativos.

Eu não mereço sua admiração.
A beleza do meu magoado coração
Já foi eclipsada por incontáveis curativos.

V.

domingo, 15 de setembro de 2024

Chegou a temida noite de domingo.
A Besta-fera de dez diademas
Que rasga meu peito buscando poemas.
Mas quase nada rima com domingo!

Não se acha nem mesmo um "i" sem pingo!
Domingo é como um par de algemas,
Prendem as mãos até verterem postemas,
A razão de todo o meu choramingo.

Que dia maldito! E há quem o chame "santo".
O maior culpado por esse meu pranto
Que ninguém me ajuda a enxugar.

Mas para ser justo, a Besta-fera sou eu.
Rasgo e destruo tudo o que é meu
Na esperança de a minha tristeza expurgar.

V.
Hoje bateu-me uma tristeza sem par.
Pegarei a próxima saída,
Não participarei mais da tua vida.
Au revoir.

Tu não precisas de alguém para rimar
Versos sobre uma realidade dolorida.
A minha mente iludida
Não te colocará mais num altar.

A inspiração acabou.
Isto era pra ser um soneto, mas morre aqui.

V.

sábado, 14 de setembro de 2024

Eu sei o que eu preciso fazer.
Sei que será doloroso,
Já sinto até o gosto terroso
Que sobe à boca quando penso em dizer.

Terei que aprender a conviver
Com esse sentimento ulceroso,
Que me mata por dentro deixando-me ansioso,
E faz-me desfalecer.

E se eu continuar a nadar contra a correnteza:
Afogar-me-ei, com certeza!
E não teria dinheiro para um velório agora.

Às vezes nem parece que sou tão inteligente,
Pois me coloco em cada situação deprimente
Que nem parece que ainda quero ver outra aurora.

V.

terça-feira, 10 de setembro de 2024

Queria poder escrever sobre um belo jardim.
Cheio de árvores e flores de todas as cores,
E diversos animais correndo livres sem pastores,
Como era nessa terra Tupiniquim.

Mas o mundo onde vivo está londe de ser assim.
Os burgueses com seus mecanismos opressores
Cultivam nessa terra fértil apenas horrores.
São mais inimigos da madeira viva do que o cupim.

Eles estão em guerra contra a vida,
Salgam e queimam a nossa carne, já moída,
Para matar apenas a fome de quem já está de barriga cheia.

Para quem trabalha sobram as comidas envenenadas,
O fogo e a fumaça das pavorosas queimadas
Causadas pela burguesia podre que nos odeia.

V.

domingo, 1 de setembro de 2024

Um brinde à tristeza que me carcome.
Eu já aceitei meu amargo destino.
Sou um vazio, sofrendo desde menino,
Que foi registrado sem sobrenome.

O dissabor da noite já me consome;
Sinto subir à boca um retrogosto alcalino.
Meu espelho reflete tudo o que abomino,
Quem se mistura comigo farelo come.

Até no Zodíaco já busquei justificativa
Para essa minha existência à deriva.
Mas nem os astros responderam meu choro.

Eu tentei ser o homem da gravata florida,
Apenas para descobrir que minh'alma é lúrida.
Onde piso deixo um rastro de mau agouro.

V.